Latentes Viagens

Este espaço é um experimento aberto, amplo, intuitivo e original. Liberto das amarras acadêmicas, sistêmicas e conceituais, sua atmosfera é rarefeita de ideias e ideais. Sua matéria prima é a vida, com seus problemas, desafios e dilemas. Toda angústia relacionada ao existir encontra aqui seu eco e referencial. BOA VIAGEM!

Assim como a sociedade, os países e principalmente, as grandes nações, ninguém gosta de se olhar no espelho. Ninguém gosta de ouvir a verdade, em especial o povo brasileiro. As pessoas sorriem na sua frente e te apunhalam pelas costas. Países do hemisfério norte tendem a ser mais sinceros neste sentido mas infelizmente pagam um alto preço por isso: solidão, angústia e isolamento. Não existe nenhum estilo de vida que não ganhe de um lado e perca por outro. Tudo na vida parece ser assim, dual: positivo/negativo, bom/ruim, bem/mal, quente/frio, claro/escuro, é um jogo de polaridades,  que ora alternando entre um e outro, nos fornece um tipo de conhecimento e entendimento necessário para sobrevivermos neste plano. 

O mundo é um grande espelho onde vemos refletida a nossa imagem. Quebrar este espelho é perigoso e envolve questões complexas, como o ser do outro. Nietzsche, por exemplo, diz que  os homens se distinguem justamente pelo "quantum" de verdade são capazes de suportar. Infelizmente, não creio em verdades eternas e absolutas, principalmente na esfera das relações humanas. Primeiro, para conhecer o outro é necessário conhecer a si mesmo. Nos relacionamos com o outro na mesma intensidade e nível que permitimos nos relacionar conosco mesmo. Os relacionamentos humanos nascem da arte do encontro e crescem pela cumplicidade através do tempo.

Segundo Marx, toda relação nasce do interesse; segundo Freud, nos procuramos para fugir do tédio; segundo os teóricos econômicos, para trocarmos mercadorias; segundo Blaise Pascal, por dois motivos, primeiro por não conseguirmos ficar sozinhos conosco mesmo, segundo pela vaidade de nos mostrarmos ao outro; segundo Aristóteles por sermos seres políticos e essencialmente sociais, gregários. Alguns idealistas diriam que a amizade é o fim último da existência. Enfim, existem várias possibilidades e justificativas para nos relacionarmos com o outro. É, porém, indubitável pensar que ninguém evolui ou erra sozinho. A solidão limita nossa forma de sentir e pensar o mundo.

Voltando-nos ao cerne de nossa questão, peço desculpas se acaso for "demasiado humano" e pessoal. Acredito que todas as teorias expostas acima contém partes da mesma verdade: necessitamos do outro, pois somente um ermitão, completamente isolado no deserto, seria capaz de proclamar em alto e bom tom que vive essencialmente sozinho e não necessita da presença de ninguém. Particularmente não acredito nesta ideia.

Vou arriscar meu primeiro passo, delineando um pequeno esboço contemporâneo da sociedade. Não podemos ignorar o fato de vivermos numa sociedade capitalista, regida por princípios e valores estruturados em seus moldes econômicos, políticos e sociais. Pode até parecer algo novo, mas desde o século XVI, o homem se distingue e difere do outro, ora pelo uso da força, ora através do aparato externo que lhe confere um certo status. Se antes eram o número de posses, gados e cavalos, hoje é o tamanho da casa, do carro e o valor do salário. Uma mulher, por exemplo, era reconhecida e admirada  pelo estilo de seu penteado, o qual conotava o número de lacaios necessários para elaborá-lo. O que quero dizer com isso? Nas relações humanas, de forma invariável e constante, há uma relação de força e poder. Não podemos ignorar aspectos como o egoísmo, o orgulho e a vaidade, nem mesmo a benevolência, a virtude e a caridade. Não nascemos predispostos a reverenciar e tratar o outro como a nós mesmos, por sermos ainda reféns das armadilhas perpetradas pelo ego. Ignorando estes dados, que por si só, revelam um lado sombrio da nossa personalidade, podemos passar a acreditar nas amizades que nascem pelo puro e simples prazer de estar na companhia do outro, de forma desinteressada e plena. Esses casos são, entretanto, raros.

Atentemos a essa pergunta: até que ponto conseguimos nos relacionar com o outro? Até o ponto em que conseguimos nos relacionar conosco e até onde ele permita e nos dê abertura. A relação humana é uma via de mão dupla e não de mão única. Depende essencialmente da disponibilidade de nossas mentes e corações. Pense por um instante: por que Deus, em sua infinita bondade iria permitir sermos tentados por seres inferiores? Ora, o amigo, muita das vezes, não tem coragem de nos dizer a verdade. O inimigo sim.

Mas não podemos ignorar que vivemos numa sociedade que prima pela superficialidade, pelo riso fácil, e ninguém está disposto a ouvir nossas queixas e lamentações. Vivemos a ditadura da felicidade em que as pessoas postam somente o lado doce e alegre da vida. Ninguém está interessado em conhecer de fato o outro, suas angústias e crises existenciais: nascemos sozinhos e vamos morrer sozinhos. A sociedade é sobretudo hedonista, o princípio de prazer anda de mãos dadas com o princípio da realidade, o que por si só, já denota uma sociedade imatura que vive em função dos seus interesses e vontades. O imediatismo como valor imanente, não existe a arte e magia da espera, tudo é para ontem. Se ontem podíamos contemplar as crianças brincando e se divertindo em velhos quintais, hoje vemos as mesmas emparedadas em seus ambientes virtuais: tudo é supérfluo e industrializado, desde dos alimentos aos consumo das idéias e dos pensamentos. Não temos tempo para nós mesmos, muito menos para outro. Não escrevemos, não respondemos, apenas adotamos um vocabulário monossilábico que corresponda aos apelos imediatos das demandas sociais. Mal temos conhecimento para emitir determinado juízo e ao invés de repensar e refletir sobre o peso das palavras, saímos por aí, vomitando nossas opiniões como verdades absolutas e universais. Não conversamos, discursamos! Não temos interesse em saber como o outro pensa e sente pois somos incapazes de nos colocar em seu lugar, não nos preocupamos em criar empatia. E assim assistimos, mais uma vez, inertes, o crescimento de uma geração imatura, irresponsável, que diz querer mudar o mundo mas é incapaz de manter seu quarto organizado. É capaz de ter as mais belas ideias mas ainda tropeçam em suas meias e cuecas pois é muito mais fácil falar do que fazer, imaginar do que realizar, enfim, somos contraditórios por excelência. Parece que estou fugindo do tema, mas se não buscarmos um esclarecimento mais aprofundado de nós mesmos e das relações que se dão neste mundo de hoje, dificilmente iremos ter um entendimento maior sobre as relações que criamos no decorrer de nossa jornada existencial.

Eu, particularmente, passei a trilhar o caminho do auto conhecimento depois de ter completado 30 anos. Não é fácil, mas não é impossível. Viver de acordo entre aquilo que eu penso e aquilo que eu faço é um constante desafio: é um exercício contínuo e diário. Mas vale a pena, já não posso culpar ou responsabilizar, a minha família, o estado ou a sociedade, sou obrigado a olhar para dentro de mim mesmo: rever meus conceitos, minhas posturas, mudar a matriz do me pensamento. Quantas vezes não fui obrigado a me ver como realmente sou : pequeno, ignorante e limitado. Não sou dono da verdade, entre aquilo que eu penso e aquilo que é, existe uma grande distância. Infelizmente toda minha bagagem teórica me serviu de muito pouco. Existe uma grande diferença entre conhecimento e sabedoria, precisei passar toda minha experiência e vivência intelectual ao filtro do coração, de nada adianta me enveredar por um universo acadêmico e literário se isso não faz de mim uma pessoa melhor, se isto não me aproxima das pessoas que pensam e agem diferente de mim, se isso não aumenta a minha tolerância e aceitação ao que é diferente de mim mesmo. A vida só faz sentido se compartilhada, não quero ver minha vida reduzida numa sala fria e sem amor. O amor não é apenas uma palavra, é algo vivo e atuante.

De qualquer forma só posso me relacionar com o outro até o ponto em que ele permitir. Depende dele se abrir ou não para mim. Só posso falar de mim mesmo. Não tenho nenhum receio ou medo de me mostrar ao outro como sou, apesar de ser desnecessário discorrer que existem certas coisas sob as quais não gostaria de falar, e sobre aquilo que não podemos falar, devemos nos calar, é a velha história, minha liberdade termina onde começa a do outro.

0 comentários:

Total de visualizações de página

GINO RIBAS MENEGHITTI

Admiro todas as pessoas que ousam pensar por si mesmas.

Blog Archive

Posts mais Lidos e Visualizados

Frases de Albert Einstein

A mente que se abre a uma nova idéia jamais voltará ao seu tamanho original.

O único lugar onde o sucesso vem antes do trabalho é no dicionário.

A imaginação é mais importante que o conhecimento.

Se A é o sucesso, então A é igual a X mais Y mais Z. O trabalho é X; Y é o lazer; e Z é manter a boca fechada.

Páginas

Translate