A
reforma do ensino médio, que deveria ser analisada, revista e discutida à
exaustão foi aprovada em três horas pelo senado e sua sanção tem gerado muita
polêmica. Os questionamentos perpassam desde o aumento da carga horária,
redução das disciplinas obrigatórias, admissão de professores até a divisão das
disciplinas por áreas de interesse.
O
aumento da carga horária é um dos pontos mais positivos. Visando à presença do
aluno em tempo integral, as escolas terão o prazo de cinco anos para se
adequarem à nova realidade. Neste período, elas terão a obrigatoriedade de
apresentar uma grade de 1000 horas anuais. A meta estipulada a longo prazo é de
1400 horas, quase o dobro da atual de 800 horas anuais.
A
redução das disciplinas obrigatórias e a divisão das disciplinas por área de
interesse é um dos pontos mais sérios e relevantes a serem destacados. O ensino
da Língua Portuguesa e de Matemática, serão os únicos de caráter obrigatório
nos três anos do ensino médio, que poderá ser cursado de acordo com áreas de
interesse do aluno e da disponibilidade de cada instituição. Todas as escolas
deverão ofertar pelo menos um dos cinco "itinerários formativos":
linguagens e suas tecnologias, matemática e suas tecnologias, ciências da
natureza e suas tecnologias, ciências humanas e sociais aplicadas e formação
técnica e profissional.
A
escolha das disciplinas e dos conteúdos que serão ofertados poderá afetar,
desde a formação dos nossos jovens, à escolha de sua profissão, e o seu
possível ingresso numa universidade pública. Ora, a partir do momento que o
governo brasileiro optar pela fragmentação do saber e do conhecimento,
privilegiando em demasia, disciplinas com caráter pragmático e aspecto
utilitarista, como no caso, Português e Matemática, a formação de nossos jovens
estará voltada, quase que única e exclusivamente, para atender às demandas
imediatistas impostas pelo mercado. Esta característica tecnicista,
mecânica e utilitária pode ser sentida na ausência de reflexão e senso crítico,
que faz com que o povo seja cegamente guiado e conduzido por instituições interessadas
na sua perpétua dependência e ignorância.
Triste
é pensar que essa reforma poderá ser apenas mais um instrumento para fomentar a
divisão de classes e dificultar o ingresso do aluno de escola pública ao ensino
superior gratuito. Enquanto as escolas públicas poderão oferecer 60% das disciplinas
incluídas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), como proposto pela medida,
a escola particular que optar por continuar oferecendo 100% de sua grade
curricular focada nas disciplinas da BNCC, estará anos luz à frente na
preparação de seus alunos para o vestibular, visto que o conteúdo das provas do
Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), principal via de acesso às universidades
públicas do país, permanecerá o mesmo.
Outra
medida, que tem provocado um certo desconforto, principalmente entre os professores
e os profissionais da educação, é a possível admissão de professores com
"notável saber" para lecionar no ensino técnico e profissional. Além
disso, profissionais graduados, sem licenciatura, poderão lecionar no ensino
médio, desde que realizem uma complementação pedagógica. Resta-nos saber como,
e por quem, serão avaliados e selecionados na prática os professores de
"notável saber" e, ainda, como será possível alguém dominar
determinada matéria e conteúdo apenas com uma complementação pedagógica.
O
aspecto científico, filosófico, histórico, artístico e cultural de uma
nação não pode ser relegado a segundo plano. É impossível avançarmos em termos
civilizatórios sem o devido material humano. Nietzsche, filósofo alemão do
século XIX, já apontava para o perigo de uma sociedade forjada somente por
cientistas e construtores de pontes. As Artes, assim como a Filosofia
e a Sociologia, são alimentos imprescindíveis na formação cultural de nossos
jovens. É impossível qualquer tipo de mudança ou avanço enquanto a nossa base
educacional estiver presa a este molde arcaico, ultrapassado, quiçá
ditatorial, que só serve aos interesses de instituições (Estado, empresas
e igrejas) que almejam lucrar com a mão de obra barata e com uma postura
irrefletida perante a vida.
As consequências são sentidas no baixo nível estético e ético exigido nos
meios de comunicação de massa, seja na televisão,
rádio ou internet. A preocupação com o belo e com os
princípios éticos não estão entre as prioridades daqueles que poderiam
operar uma brusca mudança comportamental coletiva. Ao contrário, primam
por velar de forma proposital seus verdadeiros interesses e
objetivos. Este é o verdadeiro sentido e caráter de toda ideologia.
É preciso um pouco mais de Música, Pintura e Poesia, pois é
assustador o acréscimo de sensibilidade promovida pela Arte.
É impressionante a quebra de
paradigmas proporcionada pela Filosofia, pois ela amplia o olhar
e faz o ser transitar por novas dimensões. É revolucionária a
experiência catártica operada pelo Teatro, pois nos leva ao encontro de
nós mesmos. Enfim, é necessário uma dose generosa de
"humanidade" caso quisermos elevar a consciência do "nosso
povo".
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