Como se não bastasse o
clamor “popular” pela escola sem partido, os mesmos cidadãos reivindicam e
sugerem o caminho para uma sociedade também sem partido. Seria simples
descrença, ignorância ou ingenuidade? O que leva um indivíduo a acreditar no
apartidarismo político das pessoas e das instituições? Talvez a mesma razão que
os levou a eleger o autoritarismo ao invés da democracia: o analfabetismo
político.
Por quais causas devemos
viver e lutar? O que significa ser de direita ou de esquerda? Quais são as
ideologias que formam o espectro político? Qual a diferença entre capitalismo e
socialismo? Você acredita num mundo pautado em valores individualistas ou
coletivos? Você defende uma política pública voltada para os mais ricos e
favorecidos, ou para os mais pobres e necessitados?
Quem defende o apartidarismo
político deveria colocar essas e outras questões no rol de suas reflexões, pois
tudo isso envolve uma tomada de decisão e de partido. O apartidarismo é fruto
da ausência de conhecimento e de reflexão, afinal quem o emite apenas atesta a
sua ignorância em relação aos princípios básicos da ciência política.
Por que os membros da
extrema direita estão tão preocupados em implementar a escola sem partido?
Porque é de interesse da classe dominante impor seu modo de agir, sentir e
pensar aos dominados, perpetuando a atual ordem de coisas e preservando seu status quo. E para isso, nada melhor do
que a própria educação. O sistema de ensino, público ou privado, poder ser uma
ferramenta de libertação ou de manipulação, de consciências e classes,
dependendo do conteúdo e da forma como o mesmo é transmitido e apresentado.
A presença, ou ausência, de determinadas
disciplinas na grade curricular - como a filosofia e a sociologia, por exemplo –
pode nortear comportamentos e condutas: passivas ou ativas, críticas ou
alienadas. Somos responsáveis pelas
consequências de nossos atos e escolhas; entretanto, não podemos ser integralmente
culpados pelo nosso fracasso em nível educacional e profissional, financeiro e
pessoal. Inúmeras variáveis estão em jogo, desde o meio social em que nascemos
ao familiar em que somos educados.
É possível discorrermos
sobre meritocracia numa sociedade injusta e desigual, a qual não oferece as
mesmas oportunidades para todos? Como competir em condições de igualdade, se os
filhos dos mais ricos possuem acesso irrestrito aos melhores lugares, hábitos e
pessoas, enquanto os mais pobres são privados muita das vezes do necessário?
Como julgar e condenar uma pessoa que na infância vivenciou desde as privações
materiais básicas, até o desequilíbrio doméstico e familiar, assimilando e
absorvendo cenas de violência e desamor?
Não justifico nem ouso
racionalizar as causas do ódio e da maldade, muito menos reproduzir o discurso
vitimista da auto-piedade, mas podemos comparar o ensino das escolas
particulares com os da escola pública? Podemos negar que as condições socioeconômicas
afetam diretamente a vida das pessoas, para o bem ou para o mal? É impossível
defendermos uma escola ou sociedade sem partido, enquanto existir uma sociedade
dividida em classes.
Quem defende um sistema
político e econômico capitalista crê no individualismo, no direito à propriedade
privada e na privatização das empresas públicas, afinando-se a uma economia liberal
regulada pelo mercado. Aceita também a meritocracia, que diz que todo insucesso
e fracasso é de inteira responsabilidade do indivíduo, em sua visão simplista e
reducionista do “querer é poder”.
Por outro lado, quem defende
um sistema político e econômico socialista acredita no bem-estar social e
coletivo, na divisão de terra e renda e no fortalecimento do Estado e de suas
instituições. Sabe que a principal causa da desigualdade social é a divisão parcial
e injusta das riquezas produzidas pela classe trabalhadora.
É perfeitamente normal,
compreensível e aceitável que as pessoas se revelem apáticas e desacreditadas,
tanto dos partidos quanto dos políticos, diante de tantos maus exemplos. Ainda testemunhamos
uma política e uma classe de representantes desavergonhada e viciada, tanto nas
práticas como nos hábitos, desde o famigerado “toma lá, dá cá”, até as canetadas
em benefício próprio. Escândalos de corrupção com cifras milionárias já estão
incorporados e internalizados em nossa alma e cultura há anos. Pouquíssimos políticos
mostram-se dispostos a abrir mão dos seus privilégios e vantagens em prol dos
interesses da população. A ignorância caminha de mãos dadas com a ingenuidade,
e é fruto da falta de investimento maciço na educação pública de qualidade.
Enquanto a classe
trabalhadora não for conscientizada do seu poder de voto e veto, a elite
brasileira irá se apropriar indevidamente do seu sangue, suor e lágrimas
representado pela sua força de trabalho. Quem possui os meios de produção não
quer dividir seu pão, nem tampouco está interessado na elevação de classes e de
consciência. Para ele, é mais fácil se render e se acomodar ao luxuoso conforto
proporcionado pelo séquito de escravos, dóceis e obedientes do que ter que
responder e revelar a origem de seu poder, prestígio e riqueza.